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No século XVI,
Portugal começou a focar na supervisão de suas possessões coloniais, criando um
sistema colonial próprio e estabelecendo governos gerais. O rei Dom João III
formou o Governo-Geral do Brasil, escolhendo Tomé de Sousa para a missão de
aprimorar a administração, organizar as receitas reais e assegurar a posse das
terras. Junto ao primeiro Governador-Geral, estavam os Garcia D’Ávila, que
trouxeram os primeiros rebanhos de gado zebu de Cabo Verde, juntamente com os
jesuítas da Companhia de Jesus, liderados por Manuel da Nóbrega, encarregados
de converter os nativos e regular as atividades do clero (SOUSA, 2008: 4).
Esses três fatores
foram essenciais para a colonização de Piauí, com os Garcia D’Ávila à frente da
exploração da área, subjugação dos indígenas e estabelecimento de fazendas,
onde o gado se tornou a base econômica, promovendo a interiorização dos
colonizadores e a distribuição de escravizados, enquanto a Companhia de Jesus
se dedicava à evangelização, formação de aldeias, administração das
propriedades e influência política. As experiências de colonização no Brasil
não podem ser reduzidas apenas às regiões Sul (Rio de Janeiro e São Paulo) ou
ao setor de açúcar do Norte (Pernambuco e Bahia); havia diferentes dinâmicas de
ocupação, moldadas por fatores como a extensão territorial, as várias
oportunidades de exploração, as táticas administrativas dos colonizadores, o
sistema de ventos e correntes que favoreceu o comércio e a navegação direta
entre a Europa e a costa norte, além da presença constante de estrangeiros nas
áreas próximas ao rio Amazonas.
Assim, a abordagem
de ocupação e colonização do Brasil, adaptada às singularidades de cada região,
levou à formação territorial entre o Estado do Maranhão e o Estado do Brasil em
1621.
O território foi
segmentado em duas grandes partes: ao norte, chamado Estado do Maranhão, e ao
sul, Estado do Brasil, ambos sob a supervisão da Coroa portuguesa, porém com
administrações separadas (SILVA, 2016: 16).
Assim, Piauí se
destacava como uma área estratégica, servindo como um conector entre as duas
partes do império português, o que multiplicava as possibilidades de exploração
das terras e da mão de obra indígena (SILVA, 2016: 96).
Os colonizadores
enfrentaram grupos indígenas para realizar o projeto português, utilizando
tanto confrontos quanto diálogos. Graças à sua liderança sobre duzentos nativos
durante os conflitos com os holandeses na Ribeira das Alagoas do São Francisco,
o indígena Rodela retornou à sua aldeia e passou a ser conhecido como Francisco
Rodelas ou Francisco Pereira Rodela. Os habitantes próximos à sua aldeia
começaram a ser identificados como índios rodeleiros, enquanto a região passou
a ser chamada de Sertão de Rodelas. O indígena Rodela também participou de
outras batalhas ao lado de outros nativos, como aliados dos portugueses. Em
1674, ele esteve envolvido na luta contra os "índios brabos" no
sertão do Piauí e recebeu o título de capitão.
Em
1674, a Casa da Torre organizou uma expedição contra os grupos indígenas
conhecidos como "Gueguês" ou "Gurgueias" nas áreas ao sul
do Piauí, na bacia do rio São Francisco. Em resposta, o governador de
Pernambuco, Dom Lourenço de Almeida, solicitou autorização para enviar o
Coronel Garcia de Ávila Pereira para confrontar os indígenas no interior do
Maranhão, já que eles estavam devastando as propriedades rurais em sua
trajetória, causando destruição local. Em uma carta datada de 20 de abril de
1708, a autoridade portuguesa havia já dado a Garcia D’Ávila a permissão para
atuar em todas as áreas do sertão e se opor a todas as comunidades nativas
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E SAÚDE, 1938: 67-68). O primeiro Garcia D’Ávila chegou
em 1540 junto ao primeiro governador-geral, Tomé de Sousa, e formou um grupo
dedicado à criação de gado, estabelecendo currais nas capitanias de Sergipe,
Pernambuco, Piauí e Maranhão.
A
Casa da Torre destacou-se como a principal instituição de pecuária na Bahia,
adquirindo quase um status governamental e gerindo terras conquistadas ao longo
de três séculos. A família D’Ávila formava uma classe privilegiada de
comerciantes e acumuladores de riqueza que estavam envolvidos em várias
atividades comerciais, frequentemente em negociação direta com a metrópole
(SALLES, 2017: 270).
Os
primeiros colonizadores ampliaram seus currais na região do Vale do Rio Piauí,
Gurgueia, Canindé e Parnaíba. Entre os sertanistas que chegaram ao Piauí,
destacam-se os bandeirantes que acompanhavam Domingos Jorge Velho, além dos
vaqueiros da Casa da Torre, que se uniram a Domingos Afonso Sertão (MOTT, 2010:
53).
No
ano de 1662, Domingos Jorge Velho deixou São Paulo em direção ao Piauí,
cruzando o sertão da Bahia ao longo do rio São Francisco e ampliando suas
conquistas no território piauiense, nas imediações da Serra dos Dois Irmãos, na
divisa entre Piauí e Pernambuco.
Conforme
Pereira de Alencastre, a origem do nome Serra Dois Irmãos nessa região é
incerta, mas é provável que seja uma homenagem a Domingos Afonso Mafrense e seu
irmão Julião Afonso Serra, que ocuparam as terras nos vales dos rios do Piauí
(ALENCASTRE, 2005: p. 45).
Domingos
Jorge Velho se viu em um conflito judicial com a administração de Portugal,
relacionado à eliminação de Palmares e ao uso de terras no Piauí. Foi apenas em
1705 que seus direitos foram oficialmente reconhecidos, quando Francisco Castro
Morais, o governador de Pernambuco, enviou uma carta que oferecia as terras
adjacentes aos rios Poti e Parnaíba à Jerômima Cardim Fróis, esposa de Jorge
Velho (PEREIRA DA COSTA, 1974: 38).
Em 1676, o explorador luso solicitou ao
governo português a licença para
concessão de sesmarias com auxílio do governador de Pernambuco. Naquele tempo,
a administração do Piauí estava sob responsabilidade da Capitania de
Pernambuco, que era encarregada de gerenciar as áreas conquistadas e promover
sua exploração econômica.
As
primeiras sesmarias foram dadas no dia 12 de outubro de 1676 pelo governador de
Pernambuco, Dom Francisco de Almeida, a Domingos Afonso Mafrense, Julião Afonso
Serra, Francisco Dias de Ávila e Bernardo Pereira Gago, totalizando quarenta léguas.
Cada beneficiário recebeu 360.000 hectares, o que equivale a aproximadamente
5,7% da área atualmente conhecida como Piauí (SILVA, 1996: 22).
A
escassez de supervisão da coroa portuguesa sobre a concessão de sesmarias
favoreceu a concentração de terras, intensificando a desigualdade na estrutura
fundiária. A base voltada à pecuária facilitou o crescimento da sociedade rural
e contribuiu para o tamanho considerável das propriedades dos sesmeiros. Nos
inícios da ocupação, a elevada concentração fundiária provocou conflitos entre
os posseiros, que contavam com o apoio de padres que desejavam evitar os
tribunais de Bahia e Pernambuco, onde as disputas de posse eram decididas, e os
sesmeiros, que possuíam os títulos das propriedades, mas muitos não habitavam
ou cuidavam das terras, sendo protegidos pelas autoridades do domínio
português.
Durante
os séculos XVI e XVII, a maioria dos africanos que chegavam aos portos da Bahia
era destinada às plantações de cana-de-açúcar. Nesse período, o sistema de
redistribuição de escravizados no mercado interno ainda não estava tão avançado
como se tornaria nos séculos XVIII e XIX.
Com
a descoberta de minérios no Brasil, o volume de africanos desembarcando no país
aumentou, e o tráfico atlântico foi reorganizado para atender a essa nova
demanda. Além disso, os escravizados passaram a ser redistribuídos para a
região do rio São Francisco e o rio das Velhas (RIBEIRO, 2005: 95 e 102).
Assim,
os traficantes partiam de Salvador com carregamentos de escravizados em direção
ao sertão, abastecendo o comércio e utilizando as principais rotas do gado. Não
é viável determinar quantos africanos chegaram à capitania do Piauí, seja pela
zona rural ou pela costa, principalmente devido à ausência de registros e
fiscalização, além da atuação de indivíduos e da autonomia da área da vila de
Parnaíba.
O
desenvolvimento do comércio de pessoas escravizadas na área foi impulsionado
pela recuperação da agricultura na parte norte, que buscava trazer produtos
como açúcar e tabaco para exportação, além de fornecer farinha de mandioca e
carne bovina para o comércio regional (RIBEIRO, 2005: 107).
Uma
repercussão dessa revitalização agrícola foi o crescimento da quantidade de
pessoas escravizadas adquiridas em Salvador e mandadas para a capitania do Piauí.
Entre 1760 e 1770, aproximadamente 10% das remessas anuais de escravos que
saíam de Salvador para outros destinos eram formadas por africanos e crioulos.
Durante
esse período, 194 indivíduos, originários da África e de origem mista, foram
transportados de Salvador para a capitania do Piauí, com o ano de 1768 se
destacando, pois, 92 pessoas escravizadas foram enviadas.
Após
a fundação da comunidade de Jerumenha em 21 de junho de 1762, João Pereira
Caldas voltou a Oeiras e seguiu para o norte da região, passando pela paróquia
de Santo Antônio do Surubim, que acabaria se tornando a cidade de Campo Maior,
onde iniciou a construção do pelourinho. Ele estabeleceu a vila de São João da
Parnaíba no local denominado Testa Branca, criou a vila do Marvão na paróquia
de Nossa Senhora do Desterro do Poti, e na paróquia de Nossa Senhora da
Conceição dos Aroazes, instituiu a vila de Valença (MACHADO, 2017: 155-156).
A
cidade de Oeiras se destacou como uma relevante rota comercial para os
tropeiros, com ênfase na venda de animais e escravizados, facilitando a
distribuição de vários produtos entre outras vilas da Capitania. Os tropeiros
eram fundamentais para a troca e a distribuição de diversos itens, exercendo um
papel crucial no abastecimento da capitania e oferecendo mão de obra e produtos
das capitanias de Pernambuco e Bahia.
Após
a saída de João Pereira Caldas da gestão da Capitania, a sede da vila foi
transferida para o Porto das Barcas. No século XVIII, as famílias CastelloBranco e João Paulo Diniz chegaram à área, trazendo rebanhos de Pastos Bons, no
Maranhão, e arrendaram a Ilha do Caju para a elaboração de charque (MAVIGNIER,
2005: 48). A vila prosperou enormemente na Capitania devido ao comércio e à
exportação de produtos agrícolas, pecuários e extrativos. As atividades
industriais e comerciais ligadas ao gado e seus derivados possibilitaram a
acumulação de riquezas, especialmente com a criação das charqueadas de Domingos
Dias da Silva.
Texto de Eugênio Pacelly Alves
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RIBEIRO, Alexandre Vieira. O tráfico atlântico de escravos e a praça mercantil de Salvador, 1680-1830. 2005. 149 f. Dissertação. Mestrado em História Social. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. 2005.
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